Pedaços de Mim
Precisava juntar meus pedaços, escolhi as palavras...
Capa Meu Diário Textos Áudios E-books Fotos Perfil Livros à Venda Prêmios Livro de Visitas Contato Links
Textos

 

 

FOI O VENTO

 

POR: Sônia Machado

 

Capítulo 21

1679213.png

 

 

DEPOIS QUE LÍVIA FECHOU A PORTA E ARTHUR FICOU DO lado de fora, restou a ele descer as escadas rumo à rua e seguir em frente.

—É a única opção que nos resta em qualquer circunstância. —Ele admitiu. Mas não era fácil porque os passos não queriam lhe obedecer.  Ele queria voltar e subir correndo as escadas e encontrar Lívia abrindo a porta lhe dizendo que não partisse. Que o perdoava. Que o entendia.  Que precisava dele agora mais do que nunca.

Lívia tinha se tornado essencial na vida de Arthur, desde aquela tarde que a vira lutando contra o vento para recuperar sua boina. Ele queria cuidar dela agora que passava por momentos difíceis. Não a queria deixar sozinha. E não queria ficar sozinho.

Ele acreditava que algo especial o unia a Lívia. Sim, ele acreditava que duas almas se encontram, se acham no meio de tantas outras e se aproximam como nas comédias românticas, nos contos de fadas, nos romances "shakespearianos".

Era difícil para Arthur acreditar que o mesmo destino que os unira os havia também distanciado. Ele percebeu como o amor às vezes é frágil diante dos problemas.  Então seria mesmo amor o que vivera com Lívia?

— Como pode um amor em tão pouco tempo e, na primeira incompreensão se mostrar tão instável?  Lívia nem sequer quis me ouvir. —Arthur disse para si mesmo quando alcançou o último degrau da escada e abriu o portãozinho que dava para a rua. 

 Mas ele sabia... Pelo menos imaginava que isso fosse acontecer. Por isso tinha adiado em contar tudo sobre o projeto de demolição da casa onde Lívia morava. Ele tinha medo de perdê-la... Além disso, tinha o fato da mãe de Lívia estar em um hospital. Arthur imaginava que não fosse o momento certo de falar. Por isso adiou. E tudo acabou acontecendo antes.

Mas ele não julgava Lívia. Como esperar que ela fosse compreensiva diante dos fatos que pareciam dizer justamente o que ela imaginava. Ela já havia sofrido muito com a história de sua família que lhe escondera verdades por muito tempo. E sofria agora com a doença da mãe. Então era compreensível sua reação.

Preciso de um tempo... — Foi o que Lívia dissera antes de colocar a porta entre eles.

— Talvez tivesse sido melhor que ela tivesse me dito de vez “suma da minha vida”. — Arthur pensou ao mesmo tempo em que lançava um último olhar para a janela de frente da casa na esperança de vê-la. Mas a janela estava fechada e uma dor fria traspassou seu peito como uma espada afiada.  Mesmo assim ele teria preferido o fora radical. Não teria esperanças, porque às vezes, ela também dói. Mas não, foi como se Lívia o tivesse jogado lá embaixo na escada, mas, ao mesmo tempo, segurasse uma de suas mãos. A esperança de que ela lhe desse sua outra mão e o puxasse de volta só o tempo diria. E isso doía de uma forma intensa porque ele sabia que o tempo, muitas vezes pode ser longo demais e até chegar a ser eterno.

Então Arthur se foi. Era o melhor mesmo a se fazer do que ficar implorando. No entanto, imaginar que não passaria mais as tardes com Lívia lhe doía profundamente. Aquelas tardes simples tomando café e ouvindo o vento querendo entrar pela janela.  Mas Arthur não queria sentir aquela dor e também não queria criar lembranças.

— Não... Basta... Farei o possível para esquecer, porque, por mais lindo que tenha sido, me machuca. — Ele falou para si mesmo. O vento bateu-lhe no rosto com aquela mania que sempre tinha de açoitar ainda mais a dor dos outros. Qual seu intuito afinal? Derrubar as velhas folhas certamente. Inclusive aquelas que teimavam em ficar grudadas nos galhos resistindo à renovação.

—Será que a dor é uma espécie de renovação? —Arthur se viu perguntando enquanto fechava o portãozinho que rangeu tal qual um lamento de autopiedade. E quando Arthur saiu para a rua, ela lhe pareceu longa demais como a ausência e a saudade que já viera e se instalara em seu ser. Parecia até mesmo que não tinha um fim.

Isso tem de acabar... —Arthur pensou. E caminhou pela rua chutando as folhas como se chutasse aquela gota de esperança que Lívia deixara pingar sobre ele quando fechara a porta.

 

1679214.png

 

Arthur seguiu em frente alimentando um orgulho que nem ele mesmo entendia. Se era positivo ou negativo. Para ele, significava manter a dignidade. O que ele fez entupindo-se de trabalho nos dias que se seguiram para preocupação de Mário, seu assistente e melhor amigo, que um dia lhe disse sem rodeios:

—Ei Arthur... Quer se matar de trabalhar rapaz?

—Não sabia que trabalhar era se matar.  — Arthur respondeu sem tirar os olhos de um esboço de projeto que havia tomado todo seu tempo. Não havia saído sequer para almoçar. Era um projeto encomendado por um jovem casal que se encantara com a Casa do Lago de um condomínio, no município de Embu-Guaçu, na Zona Sudoeste da Região Metropolitana de São Paulo, um projeto que tinha sido finalista do 4º Prêmio Saint Gobain de Arquitetura – Habitat Sustentável.  Eles queriam um parecido. Só que em um sítio e, claro com o toque deles e de Arthur que gostava da originalidade. Arthur teve que se desdobrar para atender o cliente e, ao mesmo tempo fugir dos perigos do plágio.

O projeto, ao invés de ser construído sobre um lago, simplesmente era cercado por ele, mas simulando estar flutuando e possuía uma rampa de entrada e saída O estilo caixa de estrutura metálica, revestida com pele de vidros foi mantida só que em dois pavimentos e alguns detalhes geométricos diferentes e abstratos. O diferencial ficava também por conta das áreas verdes, jardins imensos, e um pequeno bosque que também pareciam flutuantes, além de uma quadra de esportes.

Por incrível que possa parecer a criatividade de Arthur estava em alta, o que o mantinha com a mente ocupada sem pensar em Lívia. Ele passava os dias desenhando projetos, conferindo obras, ou viajando a negócios.  Mal saia para comer, o que levou Mário seu assistente a ficar preocupado, pois Arthur gostava de sair, inclusive, para fazer caminhadas em pleno horário comercial.

— No seu caso está parecendo que quer se matar de trabalhar sim. — Mário havia respondido com ar brincalhão, embora no fundo estivesse realmente preocupado com Arthur. —Sei que tem ficado aqui até tarde trabalhando.

—Anda me espionando?—Arthur levantou os olhos do projeto e encarou seu amigo e assessor.

— Huumm... Talvez... —Mário fez um ar de réu confesso.

—Com que direito fez isso?  — Arthur perguntou simulando contrariedade.

— Te peguei... —Mário deu uma gargalhada.

— Me pegou? — Arthur olhou para ele sem entender.

—Fica tranquilo Arthur. Não ando te espionando. Apenas imaginei que estivesse trabalhando até tarde, pois suas olheiras são visíveis.

Arthur estava realmente trabalhando até tarde. Saía do escritório já tarde da noite e, quando chegava em casa ainda continuava trabalhando. Muitas vezes dormiu debruçado sobre algum projeto.

—Então jogou verde para colher maduro... Quanto às olheiras... Receio que não está enxergando bem Mário. —Ele negou, mas no fundo sabia que Mário estava certo. Ele mesmo já havia notado as tais olheiras. Só não queria admitir.

— Vem cá... — Mário puxou Arthur da cadeira e levou-o até um enorme espelho que fazia às vezes de uma parede— Veja bem e me diga se sou eu que não estou enxergando direito.

—Está de brincadeira comigo Mário? —E ambos riram ante o olhar espantado dos outros funcionários.

Mas depois com jeito mais sério e preocupado com o amigo, Mário disse por fim:

—Esse seu esforço todo me parece uma fuga.  Não quer conversar sobre isso?— Mário arriscou.

Arthur que havia acabado de puxar a cadeira para se sentar de novo, apontou o dedo para o assistente.

— Olhe aqui Mário, estamos atolados de trabalho e você querendo bancar o adivinho e pior, o psicanalista...

—Ei, ei... Calma, Arthur. Só queria ajudar.

— Se quer mesmo me ajudar, traga aquela outra pasta do projeto do Senhor e Senhora Fontes. Preciso mudar umas coisas lá. Você sabe que esse projeto está sendo um desafio não é?

—E como está... Toda essa estrutura cercada de água me fez imaginar um navio encalhado. —Mário respondeu rindo.

—Navio encalhado? Está chamando meu projeto de navio encalhado?—E atirou uma bola de papel no assistente.

—Ei não foi nesse sentido que está pensando Arthur.

—Não foi? Não se justifique. Quero ver sua cara quando ele zarpar.  —E com a mão fez um gesto para Mário deixar ele em paz e voltou a atenção ao navio encalhado. Ou melhor, ao projeto.

Arthur precisava se atolar de trabalho para não pensar em Lívia.  Em Lívia e em sua mãe doente. Queria muito saber como estavam. Mas o orgulho falava mais alto.

 

 


PARA OUVIR O CAPITULO 21 NO YOUTUBE CLICK NO LINK ABAIXO:

 

https://www.youtube.com/watch?v=M_E6BxvRmxQ

 

 


Fiz a tal cirurgia e ainda estou de repouso. vou tentando postar os capítulos que faltam aos poucos.

 

 

Sonia de Fátima Machado Silva
Enviado por Sonia de Fátima Machado Silva em 05/03/2024
Comentários